sexta-feira, 19 de junho de 2009

ENTREVISTA

A equipe Biologias entrevistou os professores Cláudia Midori e Marcos, que puderam nos esclarecer um pouco sobre suas experiências em prática de sala de aula, apontando alguns conceitos e metodologias aplicadas para o ensino da Biologia voltado a área de Genética.

Equipe: Durante sua graduação, qual disciplina que mais lhe chamava atenção? Por quê?

Cláudia: Nesse período me interessei muito pela zoologia e pela fisiologia, pois me encantei pelos inúmeros mecanismos que faziam um organismo funcionar e também pela forte interação que havia entre os seus sistemas. Para se compreender a fisiologia de um animal ou de um ser humano, precisamos relacionar informações da química, bioquímica, física e ecologia, entre outras áreas de conhecimento.

Marcos: Anatomia me chamou a atenção pelo fato de nunca ter tido contato direto com partes humanas e tive um excelente professor do qual me espelhei para pôr em prática a minha profissão de educador. Mas Bioquímica e Genética também foram matérias que me interessei.

Equipe: A Biologia é geralmente associada somente à fauna e flora, focando natureza e a interação dos organismos com esta, salientando a Botânica, Zoologia e Ecologia. No senso comum, estudos como a Biologia Molecular, Embriologia, Genética e a Citologia são muitas vezes, totalmente desassociados a Biologia e relacionados somente a Medicina. Como solucionar esse paradoxo e permitir que o aluno construa um pensamento analítico sobre a grande amplitude dos estudos biológicos?

Cláudia: Penso que um aluno que procure um curso de biologia pode até estar, inicialmente, mais interessado nestas questões relacionadas à fauna e flora, pois muitas vezes o ensino médio o direciona a pensar que a biologia se resume a isso. Porém ingressando no curso superior ele se depara com a parte da biologia que não trabalha somente com o ser vivo inteiro, mas sim com partes dele ou mesmo analisando os seus mecanismos de funcionamento desde o nível da célula. Acredito que para que um aluno universitário perceba isso, cabe aos professores dessas matérias menos visadas desenvolverem o conteúdo de modo a relacioná-lo com o todo. Talvez em um curso em que as matérias sejam menos fragmentadas e que haja uma perfeita relação entre todas elas, faça o aluno perceber que todo esse conteúdo está relacionado e que a botânica, a zoologia e principalmente a ecologia são, na verdade, o resultado final de um perfeito funcionamento de tudo, desde a combinação molecular até a perpetuação de uma espécie.

Marcos: O aluno tem que entender os níveis de organização dos seres vivos. Uma boa base de conteúdo, saber a função de cada organismo faz com que o aluno entenda que Biologia está relacionada a tudo.

Equipe: Durante a sua jornada escolar, o aluno é apresentado a inúmeros assuntos nas aulas de Ciências; água; poluição; animais; vegetais; e a composição da atmosfera, são apenas alguns exemplos. Em tese, essa grande amplitude contextual permitiria ao aluno a internalização e associação, desde o átomo constituinte dos gases atmosféricos, a etologia animal na interação com o meio. Aulas práticas, tanto laboratoriais como as de visitações técnicas, ajudariam o estudante a melhor assimilar o conteúdo exposto no livro-texto à vida prática. Todavia, grande parte das escolas, seja estadual ou municipal, não pode arcar com os custos gerados por essas atividades. De que maneira o professor poderia solucionar esse problema?

Cláudia:Uma das formas poderia ser, quando houver disponibilidade, a montagem de aulas práticas simples na própria instituição, havendo tempo e um espaço de uma sala de aula ou uma quadra, algumas vezes podem ser feitas atividades práticas que sejam relacionadas ao conteúdo teórico. Filmes e alguns programas multimídia também podem ajudar, pois muitas vezes a visualização de uma imagem vale mais que muitas palavras.

Marcos: Alguns conteúdos necessitam de um mecanismo a mais do que o teórico. E difícil o aluno entender as estruturas de uma célula sem que o veja. Um laboratório faz toda a diferença nessa hora, mas o professor pode usar de outros recursos. Qualquer lugar, uma sala vazia, um pátio, um fundo de um corredor, qualquer espaço disponível, o professor pode montar o seu laboratório e criar trabalhos que sirvam de modelos para melhor entendimento do aluno.

Equipe: A Biologia é vista por muitos como uma área desinteressante. Como você busca criar o interesse dos alunos dentro da sala de aula?

Cláudia: Não sei se estou enganada, mas não acredito que seja uma área desinteressante para uma boa parte dos alunos (é claro que há quem tenha afinidade e outros que não gostem nem um pouco, assim como nas outras áreas). De qualquer forma, para despertar o interesse dos alunos, procuro sempre relacionar os conteúdos com situações do cotidiano em que esse conhecimento se torne importante. Acredito que, para qualquer que seja o conteúdo ensinado, se o aluno não vê utilidade no que está aprendendo, não se esforça para aprender.

Marcos: O aluno tem que saber da importância do lugar onde vive e de como o organismo funciona. Não adianta chegar à sala de aula, jogar o conteúdo na lousa e esperar que os alunos se interessem pelo que vêm. O professor tem que chamar a atenção do aluno e desapertar a curiosidade do mesmo, só assim o aluno se interessara pela Biologia.

Equipe: Em sua opinião, qual o assunto da Biologia de maior complexidade a ser explicado em uma sala de aula?

Cláudia: Talvez não seja o mais complexo, porém acho que o mais importante e difícil de ser ensinado (digo, bem ensinado) é a citologia, pois esta é uma matéria dada logo no início do ensino médio, quando o aluno ainda está muito imaturo. Desse modo ele não compreende bem o que está aprendendo e tudo passa a ser uma “decoreba”, porém se esse conteúdo não foi bem assimilado, ele terá dúvidas na genética, na fisiologia, na botânica, na zoologia, entre outras...

Marcos: Ciclo de Krebs sem dúvida é o mais difícil. Você precisa ter paciência e usar todos os recursos possíveis para que o aluno entenda o conteúdo. Fisiologia vegetal também é difícil, mas nada se compara ao ciclo [risos].

Equipe: Qual a importância do ensino, mesmo que breve, da Genética dentro da sala de aula no Ensino Médio?

Cláudia: As aulas de genética fazem o aluno compreender os mecanismos de transmissão das características hereditárias, mesmo que superficialmente.

Marcos: Você chega para a sala e pergunta: Você não gosta do seu nariz, orelha, olhos? Não se culpe, você não tem nada a ver com isso, culpe seus pais afinal a recombinação de seus genes fez você sair assim. Uma brincadeira assim faz o aluno se interessar e se perguntar como que através da recombinação de seus pais o fizeram ter essas características. O conteúdo é amplo e o aluno tem que entender a cada fase, os seus processos. Uma aula dinâmica é fundamental. Aplico vários trabalhos como jogos, por exemplo, para que o aluno olhe para si e para os outros e entenda como funciona o organismo através das recombinações.

Equipe: Muitos ex-alunos quando questionados sobre as aulas de Genética, ministradas dentro da grade curricular de Biologia, lembram dos “quadradinhos de AaBb”. O quadro de Punnet pode ser considerado ferramenta essencial para a apresentação do conteúdo de Genética em uma sala de aula do Ensino Médio? Há alguma outra abordagem didática (jogos, dinâmicas) para apresentar esse conteúdo?

Cláudia: O quadro de Punnet é uma maneira simplificada de abordar o tema, porém é bem distante do que realmente acontece (separação dos pares de homólogos e posterior junção dos cromossomos na fecundação) e por isso os alunos não relacionam que o que está na primeira linha e na primeira coluna do quadro são os gametas que podem ter se formado de acordo com as possíveis separações dos pares de cromossomos homólogos do macho e da fêmea . Há alguns jogos e dinâmicas que conheço que exemplificam o ocorrido, mas que no final recaem no mesmo esquema de sempre.

Marcos: O quadro é sim essencial, mas a Genética vai muito além disso. Se ele entendeu o AaBb significa que conhece as recombinações genéticas o que já é um bom começo. Como o conteúdo e complicado do aluno entender, a matéria exige do professor uma forma de facilitar o aprendizado. Brincadeiras e trabalhos ajudam muito no ensino.

Equipe: Quando é abordado o processo de descrição do DNA, alguns alunos se confundem com as funções exercidas pelo rRNA, mRNA e tRNA. Como esse tema é abordado nas suas aulas?

Cláudia: Quando dou aulas sobre núcleo celular, primeiro falo sobre o DNA explicando a sua importância e a sua constituição. Na sequencia falo da duplicação do DNA. O RNA é abordado mais tarde e depois de explicada a diferença entre as moléculas de DNA e RNA, explico o mecanismo de síntese protéica, apresentando os diferentes tipos de RNA e sua função dentro do processo. Nesse momento sempre ajuda se a escola oferece algum recurso audiovisual que auxilie a compreensão do processo.

Marcos: Modelos didáticos ajudam muito, só com o conteúdo teórico fica difícil o entendimento da função de um DNA. Nas minhas aulas eu crio junto com os alunos alguns trabalhos para melhor absorção sobre o assunto. O aluno aprende mais quando o conteúdo é palpável, algo que eles possam tocar para ter uma dimensão de como funciona, por isso crio sempre modelos didáticos.

Equipe: Nas suas aulas há alguma atividade prática (palestras, seminários, exposições) que envolva genética? Como ela é desenvolvida?

Cláudia: Na escola que trabalho, por se tratar de uma escola que visa a formação técnica, a quantidade de aulas semanais de biologia é muito pequena. No terceiro ano, quando a genética é abordada, por uma questão de bom senso, não programamos atividades fora do horário da aula, pois é esperado que os alunos estejam fazendo estágio nesse período. Por isso, raramente desenvolvemos tais atividades, o máximo que faço é orientar para que o aluno vá a alguma exposição.

Marcos: Sim, quando possível às aulas de laboratório para esfregaço sanguíneo e coagulação do sangue. Criação de modelos de DNA de isopor. Demonstração de cromossomos e genes através de trabalhos elaborados com caixa de sapatos e objetos como nariz, peruca, orelhas de plástico.

Equipe: Qual dica você daria para os alunos que estão em dúvida sobre o futuro acadêmico, sem saber qual área escolher? E como apresentaria a área da Biologia?

Cláudia: Aconselharia que eles delimitassem algumas áreas de interesse e que conversassem com os profissionais relacionados e até, se possível, que vivenciassem um período de estágio ou mesmo só de acompanhamento de algum profissional.
Uma outra dica é visitar as faculdades e conversar com os alunos, ver a infraestrutura, visitar os laboratórios, conversar com alguns professores e simplesmente sentir o ambiente. Algumas vezes a simples afinidade pelo ambiente e o fato de se identificar com os alunos já diz muita coisa (afinal cada curso, em geral, tem um perfil e um público diferente)!
A área da biologia seria para pessoas que entendem a real importância de cada pequena parte no nosso planeta, pois cada molécula, cada tipo celular, cada reação dentro de um organismo, cada interação entre grupos celulares, cada órgão, cada sistema, cada organismo,.... enfim, tudo está relacionado e a interferência em qualquer um dos pontos dessa enorme rede altera positiva ou negativamente todo o resto!

Marcos: Você quer que seu final de domingo seja bom? Que sua segunda feira seja sempre maravilhosa? Então faça o que goste. Já pensou acordar segunda feira para trabalhar numa coisa que você não gosta? Vai viver de mau humor. Algumas pessoas seguem os conselhos dos pais e acatam com a decisão deles, mas você tem que entender que um dia eles partirão e você irá ficar sozinho e infeliz por viver uma vida que não desejou. Não é bom para ninguém, você tem que trilhar o seu caminho independente da profissão que escolher. A Biologia está em você e é o sentido da vida.

Professora: Cláudia Midori Kuribara de Carvalho
Graduação: Instituto de Biociências da USP
Pós-graduação (mestrado): Mestrado em Fisiologia Geral - Instituto de Biociências da USP
Tempo de experiência em sala de aula: 11 anos


Professor: Marcos
Graduação: Licenciatura e Bacharelado na Universidade São Judas Tadeu
Tempo de experiência em sala de aula: 25 anos